terça-feira, 30 de julho de 2019

Do encanto das Montanhas

Já passaram há uns meses os dezoito anos deste álbum. Estarão a passar uns dezesseis ou dezassete anos desde que o conheci. Tenho dessas coisas, às vezes só descubro a música, os locais, as pessoas, os filmes, os livros ou a poesia muitos anos depois de terem passado por mim. Caramba, já tinha pelos brancos  na barba quando descobri que adoro fígado de cebolada, fados do Carlos do Carmo, que gosto de vestir cor de rosa ou que uma sardinha assada na brasa é melhor que picanha.
Mas voltando ao Rufus, e à Poses, a verdade é que nunca foram consensuais entre os meus amigos. Para começar, o cd foi me emprestado com um disclaimer: "não acho que vás gostar".
Gostei. Ao ponto de ir a Mangualde e voltar com o meu pai a ouvir o cd em loop, e o pobre do Senhor Coronel fazer uma pergunta, que quem o conhece não lhe imagina: não trazes outro cd contigo?
Tenho um amigo que lhe chamava o Pavão, a minha irmã, que o adora, chama-lhe a Diva.
Num Primavera Sound há uns anos, todos os que estavam connosco a ver o concerto foram embora ver outras coisas, não tinham pachorra.
Havia um amigo que quando me apanhava a ouvir Rufus perguntava porque é que ouvia essas mariquices.
Há neste tom melodramático, diria mesmo rufiano, em que a Poses encontra refúgio, um desbravar de caminhos. O homem não se decide, vagueia entre um orientalismo subtilmente pontuado pelo piano e uma orquestração clássica que revela a sua paixão operática. O poema também vive nesse meio da estrada entre a esperança e o desamor. Faz questão de viajar do passado ao futuro em flic-flacs que a Mary Lou Retton não desdenharia, enquanto a voz vai ganhando força a cada memória ou ideia cantada. Alguém me disse, uns bons anos depois de ter conhecido o album e esta música, que se se prendesse com atenção à canção, chega a ser assustadora a forma como parece que ele vai sufocar, tão de dentro vem esta interpretação.
Mas esta música é essa viagem, até ao limite, das cordas vocais, do poema e do amor.
E tudo acaba numa montanha, daquelas montanhas de onde se conseguem ver novas montanhas.
Não é música para quem gosta de planícies.

https://youtu.be/npebzYHKRSQ